quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Despedida

Mudamos. A obra acabou. Quer dizer: sempre ficam umas coisinhas pra resolver, uns ganchinhos pra instalar, uns retoques na pintura.

Fiquei meses longe daqui porque meu assunto agora é a Emília. Mas não podia deixar de passar por aqui para encerrar este blog com um relato sobre a última visita do mestre de obras ao apartamento.

Ontem seu João foi lá terminar umas coisinhas que ficaram faltando. Consertar o chuveiro que ficou vazando, instalar os eletrodomésticos... Como ele tinha cobrado barato na obra, mamãe sugeriu deixar um extra pra ele.

Confesso que não estava muito disposta a ser tão generosa. A obra atrasou, várias coisas ficaram mal feitas. Mas grande parte do problema foi justamente porque ele cobrou muito pouco, e no fim da obra não havia mais dinheiro pra manter homens trabalhando. Problema dele? Pode ser. Mas minha mãe lembrou: "ele é pobre, esses homens todos são pobres".

Ontem ele instalou a lavadora, a lava-louças e o fogão. Carregou muito peso, porque o buraco onde se encaixa a lavadora é todo fechado, e teve de montar e desmontar a parede do armário ao lado pra poder mexer na tubulação. Depois de terminar, a Bel deu o cheque pra ele, mas ele parece que não entendeu, não leu, não viu.

Meia hora depois, ele liga.

- Isabel, esse cheque é pra mim mesmo?
- É, seu João.
- Eu fui pôr gasolina, que meu carro tá sem gasolina... agora que eu vi. Obrigado, Isabel. Foi o melhor presente de aniversário que eu ganhei. Faço 54 anos agora sábado. Obrigado, Isabel.

Nessas horas a gente se lembra do que é realmente importante: pessoas, não coisas. Muito melhor que massacrar um pobre coitado por causa de algo que sumiu (ainda mais considerando que várias pessoas passaram pela obra) é reconhecer o trabalho duro de um homem que vai fazer 54 anos e ainda não tem dinheiro pra pôr gasolina no carro.

Houve problemas. O piso do banheiro de empregada ficou bem manchado, sumiu a capa da duchinha do banheiro da suíte e ficaram faltando dois ganchinhos cujo paradeiro se desconhece. Mas o apartamento ficou lindo, do jeito que a gente queria: colorido, alegre, aconchegante. E Seu João trabalhou muito.

Encerro minha participação neste blog dizendo que nada é grave. É muito comum, durante uma obra, acharmos que o mundo vai acabar. Mas os prejuízos, os imprevistos, fazem parte do processo. A gente pode tentar minimizá-los, mas querer chegar ao nível da perfeição vai nos enlouquecer. E, no final, ninguém percebe aquilo que você achou que ficou super mal feito.

O que faz um lar não é o granito, o porcelanato, a torneira de mil reais. O que faz um lar é a capacidade da família que lá habita de receber os outros com humanidade. E concluo esta experiência com uma certeza: eu e minha arquiteta, e meu marido, e minha mãe, e meu pai, e todos os que nos ajudaram, construímos um lar.

+++
OBS: Vou tentar retornar aqui, ou pedir pra Bel fazer isso, para postar as fotos de como ficou o apartamento.

5 comentários:

  1. É isso mesmo. As coisas só são feitas porque tem pessoas envolvidas no processo. E vc mostrou claramente como isso é importante. O que "some" não é nada perto da humanidade e da humildade de quem fica. E pode ter certeza que vc ganhou em dobro. Pelo AP lindo e tmb pelo gesto de carinho com o outro.

    Bjsssssss e curta muito a sua casinha.

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  2. Muito legal isso, Lia!
    Eu aprendi a me revoltar só contra grandes instituições, lojas grandes etc. Quando são pessoas, prestadores de serviço, não dá para cobrar tanto, ainda mais quando eles cobram barato e, como vc viu, reforma é assim mesmo: os prazos e o orçamento sempre estouram. Não sei se teria coragem de me meter em uma reforma, estou penando para arrumar coisinhas no apartamento que nem é meu e já me estresso.
    O importante mesmo são as pessoas, vc disse tudo. Vamos parar de pensar só no financeiro, nas cifras e olhar os indivíduos, a comunidade em torno.
    Que vcs sejam muito feliz neste novo LAR!!

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  3. Eu queria dizer que tantas vezes nessa obra, quando eu era incopetente (e ainda sou), ou esquecida, ou desligada, ou inesperiente, eu me senti tratada como gente (como com o seu João), amada como irmã. Vcs foram muito generosos comigo em tantos sentidos...tanto profissionalmente quanto afetivamente. Eu nem tenho como agradecer. Vou voltar pra postar os antes e depois, tenho que pegar as fotos com a mamãe. Amo-vos.

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  4. ai, sim! quero fotos!
    de antes e depois e tudo o mais. pode?

    beijos

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  5. "nada é grave" é dito de gente espiritualizada e cheia de amor, coisa de mãe boa.

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